terça-feira, 28 de junho de 2016

Sicília e a Civilização Islâmica

A Sicília, juntamente com o sul da Itália, também foi uma das rotas mais importantes da civilização islâmica para a Europa. Os muçulmanos conquistaram Palermo, capital da Sicília, em (216 dH / 831 dC) e a governaram até (485 dH / 1092 dC), ou seja, cerca de 260 anos, durante os quais a vida na Sicília teve uma impressão árabe islâmica.

Durante esses anos, os muçulmanos estavam interessados no desenvolvimento e construção e estavam ansiosos para introduzir aspectos da civilização, como mesquitas, palácios, banhos, hospitais, mercados e castelos. Grandes indústrias, como a de papel, construção naval e mineração foram introduzidas. As ciências e as artes progrediram na Sicília, e os alunos imigraram da Europa para a Sicília em busca do conhecimento. Em seguida, a cidade se transformou em um importante centro através do qual a herança islâmica transferiu-se para o Ocidente. Também teve início o movimento de tradução do árabe para o latim, semelhante ao realizado na Andalusia.

Embora o governo islâmico da ilha tenha terminado no final do século XI, a civilização islâmica continuou sob os cuidados dos reis normandos, sob cuja proteção viveram muitos estudiosos muçulmanos, como o sábio geógrafo Muhammad Al Idrissi, que desenhou para Rogério II (1130 -1154 dC), o mapa do mundo como ele era conhecido no seu tempo em um círculo de prata lisa. Al Idrissi também escreveu o livro “Nuzhat al-Mushtaq fi ikhtiraq al-Afaq (A jornada dos aspirantes a penetrar os horizontes), que descreve este mapa. Em seu livro “A história da literatura árabe geográfica”, o orientalista russo Kratchkovski[1] comentou sobre este livro. Falando de Rogério, ele disse: "E seu encargo a um cientista árabe em particular para fazer uma descrição do mundo como ele era conhecido naquela época é uma prova clara da superioridade da civilização árabe naquela época, e do reconhecimento desta superioridade da parte de todos. O Tribunal dos normandos na Sicília era oriental em sua metade, se não mais."[2]

A nova cultura islâmica atraiu os europeus, e seu impacto continuou durante o governo dos normandos. A vida na corte da Sicília - especialmente durante o reinado de Roger II e Frederico II - foi próspera e elegante, e tinha como objetivo aproximar-se de Córdoba. Os dois reis adotaram o estilo de vestir e o modo de vida árabe. Os governantes normandos da Sicília tiveram assessores e funcionários árabes e muçulmanos, e estudiosos de Bagdá e da Síria estiveram sob o estandarte deles. Mais ainda, três reis normandos na Sicília receberam títulos árabes, Roger II carregou o título de "Al-Mu'tazbillah", Guilherme I recebeu o título de "Al-Hadi biamrillah", e William II "Almusta'iz billah". E estes títulos apareceram em suas inscrições[3].

Frederico II (1194 - 1230 DC) foi coroado imperador do Sacro Império Romano em 1220 dC, mas ele preferiu viver na Sicília, ele tinha um interesse especial em ciências e encorajou as discussões científicas e filosóficas. Foi ele quem fundou a Universidade de Nápoles em 1224 dC, que tinha um grande número de manuscritos árabes. As culturas árabe e islâmica se espalharam nas universidades européias, incluindo a de Paris e Oxford, e vários livros foram traduzidos do árabe para o latim. Entre os tradutores: Stephen de Antioquia (1127 dC), Adelardo de Bath[4] (cerca de 1133 dC)[5], e Michael Scot[6], que traduziu livros para o rei Frederico II, incluindo Ibn Rushd.

O rei de Nápoles, Carlos I se interessou na tradução dos livros árabes de medicina para o latim e criou uma instituição que compreende experientes tradutores, tais como Faraj ibn Salem, Mussa de Salerno, bem como os escribas e revisores. Os livros de “Al-Hawi” de Al-Razi e “Taqwim al-Abdan” por Ibn Jizla foram traduzidos nesta instituição.

A Sicília foi preparada para a transferência do pensamento antigo e contemporâneo. Entre os seus habitantes havia quem sabia o idioma árabe e o idioma grego, juntamente com alguns intelectuais que sabia latim. A Sicília era filiada ao Império Bizantino e teve alguns aspectos culturais gregos. A existência das três línguas ao mesmo tempo tinha muito facilitou a transferência do conhecimento árabe. Antes disso, a escola de Salerno foi o centro para o ensino de medicina por cerca de 300 anos (900-1200 DC), situa-sele no sul da Itália e estava intimamente ligada à Sicília. O mais importante de sua história foi Constantino, o Africano de origem árabe, que nasceu na Tunísia, e tornou-se famoso entre 1065 e 1085 DC. Ele traduziu um grande número de livros de medicina do árabe para o latim. A ele é creditada a tradução de quarenta livros, incluindo Kamil al-Sina'ah al-Tibiyah (o perfeito engenho da medicina) e Al-Kitab al-Malaki (O livro real) por Ali Ibn Abbas (falecido em 1010 DC), e outros livros de Ibn al-Jazzar, Isaac ibn Imran, Isaac ibn Sulaiman, todos os três de seu país natal, a Tunísia.

Constantino deixou de mencionar os nomes dos autores originais de alguns livros em árabe. Existem diferentes razões para isso, mas isso não diminui sua importância como o primeiro tradutor que introduziu a ciência islâmica na Europa e foi o motivo do florescimento da escola de Salerno. A língua árabe foi uma das línguas ensinadas nesta escola, que foi contemporânea de grandes médicos árabes muçulmanos e autores, como Al-Razi (falecido em 925 DC), Ibn Al-Jazzar (falecido em 975 DC) e Ali ibn Abbas (falecido em 1010 dC)[7].

O Sr. Cowel Yong disse sobre Sicília: "Sicília foi um campo para o livre encontro entre as línguas dos gregos, dos latinos, dos árabes e berberes e seus conhecimentos. O resultado foi o nascimento de uma cultura mesclada, que - graças ao incentivo de Rogério II e Frederico II - desempenhou um grande papel na transferência do que há de melhor na civilização islâmica para a Europa através da Itália. Palermo se tornou no século XIII igual a Toledo no século XII, um grande centro para a tradução de livros árabes para o latim."[8]

Os normandos também mantiveram os profissionais muçulmanos porque tinham grande confiança neles[9]. E também mantiveram os mesmos sistemas administrativos e financeiros utilizados pelos muçulmanos, desde o diuan de gestão financeira e o diuan do Tesouro até o diuan de escrituras de venda de imóveis. E os registros desses departamentos eram escritos em árabe[10]. No domínio das artes militares, os normandos zelaram em recrutar muitos muçulmanos, pois esta era uma oportunidade e um terreno fértil para a transferência de habilidades de combate e, até mesmo, de indústrias militares, tais como catapultas e torres de cerco[11].

E assim, a Sicília e o sul da Itália representaram outra importante rota das rotas de transferência da civilização islâmica para a Europa.

 
[1] Ele é um orientalista russo nascido em março de 1883. Ele estudou as línguas clássicas grega e latina. Ele próprio começou a aprender árabe. Ingressou na Faculdade de Línguas Orientais da Universidade de São Petersburgo. Ele estudou história islâmica, ao lado do orientalista Barthold.
[2] Citando Mustafa al-Siba'i: Min Rawa'i Hadaratina (das maravilhas da nossa civilização), p 28. E veja sobre a autoria do livro (Nuzhat al-Mushtak) de Al-Idrissi: Sigrid Hunke: Shams al-árab tasta’ ala al-Gharb, p 416, 417.

[3] Aziz Ahmad: Tarikh Saqallyah (História da Sicília) p 76.

[4] Adelardo de Bath: (1070-1125 dC) nasceu em Bath. Ele buscou conhecimento em Tour, na Andalusia e na Sicília. Quando ele retornou à Inglaterra, ele foi nomeado professor do Príncipe Henry, que mais tarde se tornou o rei Henrique II.

[5] Najib al-Aqiqi: Al Mustashriqun (Os orientalistas) 1 / 111.

[6] Michael Scot (1175-1235 dC), pesquisador escocês, matemático, médico e astrônomo. Ele traduziu uma série de obras de Aristóteles, do árabe e do hebraico. Ele estudou com os árabes na Andaluzia e trabalhou na Sicília, na corte do imperador Frederico II.

[7] Veja: Mahmud al-Jalili: Ta'thir al-tib Al-Arabi fi al-hadarah al- urubiyah (O impacto da medicina árabe na civilização européia). Link: http://www.islamset.com/ arabic/aislam/civil/civil1/algalely.html.

[8] Citando Mustafa al-Siba'i: Min Rawa'i Hadaratna (Das maravilhas de nossa civilização) p 28.

[9] Ibn Jubair: Rihlat Ibn Jubair (Viagem de Ibn Jubair) p 298.

[10] L. Jinwardi: Al- Dafatir Al-Nurmaniyah (os Livros Normandos) 1/159-164.

[11] Aziz Ahmad: Saqallyah Tarikh (História da Sicília) p 77.

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