Sem dúvida, a história começou com a existência da própria sociedade humana, quando o homem começou a registrar os aspectos de sua vida de uma forma ou de outra, inventando assim um novo domínio para o conhecimento do homem de si mesmo. E sem dúvida, este padrão de conhecimento veio para cumprir as necessidades sociais que se impuseram sobre os grupos humanos desde o início. Assim, podemos estabelecer que a história tem uma missão social, por responder à necessidade dos grupos humanos de se auto conhecer[1].
Ibn Khaldun diz: "A História é uma das artes difundidas pelas nações e gerações, são percorridas distâncias para ser adquirida, as pessoas comuns e sem sentido almejam aprendê-la, os reis e os emires competem por ela, e é entendido por estudiosos e ignorantes. Isto ocorre porque, aparentemente, não é mais do que notícias sobre dias e países, bem como eventos passados dos primeiros séculos, onde se desenvolvem ditos e provérbios e dos quais as pessoas fazem uso em seus clubes. A história nos diz como os seres humanos tivessem suas situações alteradas, seus altos e baixos, e como os países se expandiram e construíram a Terra até que eles foram embora e desapareceram. E interiormente (ou seja, dentro da ciência da história para as pessoas bem estudiosas) há reflexão e investigação, explicação precisa das criaturas e de seu princípio, bem como o conhecimento dos fatos cujas causas são profundas. Por isso, esta ciência é essencial e de sabedoria profunda e merece ser considerada das ciência da sabedoria"[2].
A história pode ser definida como: "O conhecimento das situações das comunidades e seus países, seus traços e costumes, ações de suas pessoas, suas descendências e mortes, e assim por diante. E seu tema envolve as condições das pessoas no passado, incluindo os profetas, homens virtuosos, eruditos, sábios, reis, poetas e outros. Seu objetivo é conhecer os eventos passados, e sua utilidade reside em extrair lições de tais condições, e ganhar experiência ao observar as alterações do tempo, para se proteger dos prejuízos e buscar os benefícios semelhantes aos que foram transmitidos. Esta ciência é outra idade para aqueles que analisam e é tem uma série de benefícios para a pessoa permanente em sua cidade, que só são alcançados pelos viajantes"[3].
A ciência da história islâmica foi caracterizada pela originalidade e independência, dado que emergiu de dentro da sociedade islâmica, a fim de atender às suas necessidades e propósitos. A história islâmica não foi uma sombra do conteúdo dos outros, ou uma citação de seus trabalhos históricos e pensamentos. Pelo contrário, ela veio para responder aos sentimentos religiosos dos historiadores e foi integrante das ciências religiosas. O calendário Hijri (contado a partir da hijrah (emigração do Profeta (a paz esteja com ele)) foi a base da história islâmica para o registro de seus eventos e definição de suas datas[4].
No período pré-islâmico e no início do Islam, os árabes memorizavam a história em suas memórias. Isso não ocorreu porque eles não sabiam escrever, mas porque eles preferiam memorizar porque o talento de escrever naquela época não dava uma superioridade à pessoa na sociedade como dava a memorização. Portanto, a história dos árabes inicial eram fatos, dias e batalhas, que foram gravadas na memória e divulgadas por seus lábios. Mas, quando os árabes muçulmanos se afastaram de seus ambientes e se dispersaram pela terra para as conquistas entre povos que não falavam a sua língua, o seu dom de memorizar enfraqueceu e surgiu a necessidade da escrita. No final do segundo século após a hijrah, os muçulmanos tinham extrema necessidade de definir e transmitir os ahadith (ditos) do Profeta (a paz esteja com ele), as biografias e condições, e este foi o início da escrita da história islâmica. Mas, a escrita da história islâmica só começou a se difundir quando os povos dos países conquistados tornaram-se muçulmanos e se dedicaram ao aprendizado da língua árabe, pois a sua civilização anterior os auxiliou no amor pela história. Assim, os primeiros historiadores no Islam eram em sua maioria não-árabes[5].
Pode se dizer que os estudos de história islâmica foram inicialmente baseados na biografia do Mensageiro (a paz esteja com ele), as informações de suas batalhas e de seus companheiros que participaram nelas, a emigração de primeiros muçulmanos para a Abissínia e depois para Madinah, Makkah e Madinah foram o principal centro de atividade deste movimento histórico. Os historiadores costumavam se apoiar nas narrações orais assim como faziam os muhaddithun (estudiosos do hadith), o que evidencia que a história islâmica inicialmente tomou o mesmo estilo do hadith. Desta maneira, a informação histórica (a notícia) era relatada por uma corrente de narradores, o que é conhecido como sanad ou isnad (a corrente de transmissão) e o texto da informação, que é denominado matn. Assim, os livros que relatam as expedições e a biografia são considerados os mais antigos livros históricos que combinam hadith e história. E a razão do zelo por esses livros foi o zelo dos muçulmanos pelas palavras e ações do mensageiro (a paz esteja com ele), para te-las como orientação e diretriz.
Havia, portanto, dois métodos de escrita da história entre os muçulmanos. O primeiro método foi adotado pelos especialistas do hadith, que ficou claro através da história da biografia do profeta em Madinah. Este método se destacou pela menção da notícia com o seu com seu isnad (corrente de transmissão). O segundo método foi o método dos narradores, que ser caracterizou por dar uma imagem completa sobre o fato histórico e revelar os detalhes e mencionar a poesia e os sermãos. Este método surgiu em Kufa. Posteriormente, surgiu a combinação entre os dois métodos, assim como surgiram outras escolas sobre a história, que se destacaram pela manipulação dos assuntos que abrangem exclusivamente as expedições, as conquistas islâmicas e o estudo da genealogia.
Dentre os narradores mais famosos: Aban ibn Othman bin Affan[6], Muhammad ibn Shihab al-Zuhri, Ibn Ishaq[7], Awana ibn al-Hakam al-Kalbi[8], Saif ibn Omar al-Kofi[9] e al-Mada'ini[10], que é considerado um dos narradores mais importantes por ter se apoiado mais na corrente de transmissão do que os outros além dele e por ter adotado o método dos especialistas do hadith na crítica, exame e organizacão das narrações.
Quanto aos métodos mais importantes da escrita histórica entre os muçulmanos, esta é representada da seguinte forma:
1.Os livros da biografia profética e da expedições do Mensageiro (a paz esteja com ele):
O interesse dos muçulmanos pelos ditos e ações do mensageiro (a paz esteja com ele) para segui-las e te-las como fonte na legislação islâmica e nos sistemas administrativos incentivou os escritores a escrever sobre a biografia do mensageiro (a paz esteja com ele). Os narradores da biografia e seus livros podem ser cronologicamente divididos em três grupos: o primeiro grupo engloba principalmente Orwa ibn al-Zubair bin al-Awam, (que é tabi’i (da geração posterior à geração dos discípulos do profeta) falecido em 92 dH), Abban ibn Othman bin Affan, que deixou folhas contendo fragmentos da vida do mensageiro, e Sharhabeel ibn Saad[11]. Entre os homens do segundo grupo temos Muhammad ibn Muslim ibn Shihab al-Zuhri, considerado um dos maiores historiadores das expedições e da biografia. Dentre os mais famosos historiadores do terceiro grupo temos Muhammad bin Ishaq, a quem são atribuídos os mais antigos livros biográficos que chegaram até nós.
[1] Qasim Abduh Qasim: al-Ruwa'ia al-Hadaria littarikh (A Visão civilizada da história) P 9.
[2] Ibn Khaldun: Al-ebar wa diwan al-Mubtadaa wal khabar 1 / 3, 4.
[3] Al-Qanouji: Abjad Al-Uloum" (O Alfabeto das Ciências) 2 / 137, 138.
[4] Ver: Rosenthal: A Ciência da História entre os muçulmanos, P 267, e Ahmad Amin: Fajr al-Islam (A Alvorada do Islam) P 156-162.
[5] Abd-al-Munim Majid: Tarikh al-hadarah al-Islamiyah fi al-usur al-wusta (A História da civilização islâmica na época medieval) P 211, 212.
[6] Aban ibn Othman ibn Affan al-Umawi al-Qurashi, nasceu e morreu em Madinah, morreu em 105 dH-723 dC), o primeiro a escrever sobre a biografia do profeta. É filho do califa Othman. Ver: Ibn Hajar, Tahzheeb al-Tahzheeb 1 / 84.
[7] Ibn Ishaq: Muhammad ibn Ishaq ibn Yasar al-Mutlabi (falecido em 151 dH-768 dC), um dos mais antigos historiadores árabes, natural de Madinah. Dentre as suas obras: "Al-Sira al-Nabawia" (A Biografia Profética), revista por Ibn Hisham. Veja: Ibn Khalkan: "Wafiat al-Ayan" (Obituário de Dignitários) 4 / 276, 277.
[8] Awana al-Kalbi: Abu al-Hakam Awana ibn al-Hakam ibn Awana ibn Iyadh (falecido em 147 dH-764 dC), um grande sábio historiador, eloqüente. Seus principais livros são: al-Tareekh (A história) e Siar Muawiya wa bani Umaya (Biografias de Muawiya Umayah e dos omauitas) e outros. Veja: al-Thahabi: "Siar A’lam al-Nobalaa" (Biografias dos Nobres) 7 / 201.
[9] Saif ibn Omar al-Assadi al-Kofi (falecido em 200 dH-815 dC), um biógrafo que ficou famoso e morreu em Bagdá. Ele escreveu: "al-Jumal" e "al-Fotouh al-Kabeer". Veja: Ibn Hajar: "Tazheeb al-Tazheeb" 4 / 259.
[10] Al-Mada'ini: Abu al-Hassan Ali ibn Muhammad ibn Abdullah (135-225 dH/752-840 dC), um narrador e historiador, habitante de Bassra, escreveu muitas obras, dentre elas: "Akhbar Quraish" (A Notícias dos Coraixitas). Veja al-Thahabi: "Siar A’lam al Nobalaa" (Biografias dos Nobres) 10/400-402.
[11] Sharhabeel ibn Saad: Sharhabeel ibn Saad Al-Khatmi Al-Madani (falecido em 123 dH-740 dC), estudioso em batalhas e especialista sobre os participantes da batalha de Badr (badriin), narrava e sentenciava sobre a ciência do Hadith. Havia fraqueza em sua narração. Veja Ibn Hajar: "Tahzheeb Al-Tahzheeb" 4 / 282.
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